ATRAVÉS DO UNIVERSO: A vela acesa de Carl Sagan

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O GEDAI publica o vigésimo segundo texto da série ATRAVÉS DO UNIVERSO, coluna mensal do prof. Domingos Soares (Departamento de Fí­sica/UFMG). Conheça mais sobre o autor em sua página eletrônica. Veja os textos anteriores da série clicando neste link.

 

A vela acesa de Carl Sagan

Domingos Soares

18 de abril de 2020

“É melhor acender uma vela do que amaldiçoar a escuridão.”
– Provérbio  Popular

Carl Sagan (1934-1996), astrônomo norte-americano e divulgador apaixonado das conquistas cientí­ficas da humanidade, foi um paladino do ceticismo. Ao consultarmos um dicionário encontraremos os significados seguintes para ceticismo: disposição para duvidar de tudo, descrença, incredulidade.

Mas Carl Sagan adicionava um tempero fundamental ao seu obstinado ceticismo, qual seja, o método cientí­fico. Para ele “a ciência é como uma vela na escuridão”. A cidadania, para ele, incluí­a um entendimento pleno e pessoal de como o mundo que nos cerca é e de como funciona. Carl Sagan foi provavelmente o mais brilhante entre os cientistas que se dedicam à  divulgação da ciência.

Carl Sagan tornou-se célebre em virtude da série televisiva exibida em todo o mundo no início da década de 1980. No dia 28 de setembro deste ano completar-se-ão 40 anos da exibição, nos Estados Unidos, do primeiro episódio desta série. Ela denomina-se “Cosmos: uma Viagem Pessoal” e é constituí­da por 13 episódios de aproximadamente 1 hora de duração cada um.

Carl Sagan, na época da realização da série para TV “Cosmos”.
Carl Sagan, na época da realização da série para TV “Cosmos”.

Em Cosmos, Carl Sagan procura mostrar a aventura humana na busca de sua posição temporal e espacial no universo. Esta busca tornou-se concreta com a invenção desta fabulosa empreitada denominada “ciência”. A história do desenvolvimento da ciência é mostrada através de experiências e visitas aos locais em que ela começou a se desenvolver.

A série televisiva foi também colocada na forma de um livro, intitulado “Cosmos”, que permanece atual e instigante até os dias de hoje.

Carl Sagan é autor de muitos outros livros, a maioria deles destinada à  divulgação científica. É autor de um livro de ficção cientí­fica, denominado “Contato”, o qual serviu de inspiração para um filme de mesmo nome e de grande sucesso em 1997. O último de seus livros, publicado em 1995, um ano antes de sua morte, foi “O mundo assombrado pelos demônios” e que trazia o subtítulo “A ciência vista como uma vela no escuridão”.

Este livro representa — pode-se arriscar — uma síntese da batalha de Carl Sagan em prol do ceticismo esclarecido e da permanente desconfiança em relação ao mundo que nos cerca. “Os demônios” representam os enganos e ilusões que são apresentados às pessoas, e que têm como objetivo a manutenção de poder e o proveito próprio, por parte daqueles que os apresentam. O ceticismo é iluminado pela “vela” que é a ciência, através da ferramenta da metodologia cientí­fica.

No final do capí­tulo 4 de “O mundo assombrado pelos demônios” lemos: “Aqueles que têm alguma coisa para vender, aqueles que desejam influenciar a opinião pública, aqueles que estão no poder, diria um cético, têm um interesse pessoal em desencorajar o ceticismo”. E pouco antes, neste mesmo capítulo: “O que a ciência exige é tão-somente que façamos o uso dos mesmos ní­veis de ceticismo que empregamos ao comprar um carro usado ou ao julgar a qualidade dos analgésicos ou da cerveja pelos seus comerciais na televisão”.

E quantos fatos e afirmações “maravilhosos” nos são apresentados a toda a hora: a visita de extra-terrestres, a vida após a morte, eram os deuses astronautas?, o homem não pisou na lua, a existência de bruxos e bruxas com poderes mágicos, pulseiras, copos, etc. dotados de poderes curativos, e o que mais? Sempre céticos, iluminados pelo método cientí­fico, devemos questionar tudo isto. É a mensagem de Carl Sagan e de seu ceticismo esclarecido.

Em novembro de 1997, quase um ano após a sua morte, ocorrida no dia 20 de dezembro de 1996, Carl Sagan recebeu mais uma merecida homenagem. Desta vez foi a comunidade de Ithaca, pequena cidade universitária, localizada no interior do estado de Nova Iorque, e onde se localiza a Universidade Cornell, prestigioso centro de ensino e pesquisa mundial, onde ele era professor e pesquisador.

No dia 8 de novembro de 1997 foi inaugurado o “Passeio Planetário Carl Sagan”. Trata-se de um percurso de 1,2 km, partindo da praça central de Ithaca e terminando no Centro de Ciências da cidade. O percurso é pontuado por “estações”, que representam o Sol e os planetas solares. A estação do Sol foi colocada na praça e Plutão — naquela época ainda classificado como planeta — no Centro de Ciências. As distâncias entre o Sol e os planetas foram colocadas em escala de tal forma que a distância do Sol até Plutão — aproximadamente 6 bilhões de quilômetros — correspondesse a 1,2 km, resultando, portanto, numa escala de 1 para 5 bilhões.

Eu estava em Ithaca neste ano, realizando um estágio de pós-doutoramento no Departamento de Astronomia, da Universidade Cornell, e tive a grande alegria de comparecer, junto a minha esposa, à  inauguração do Passeio Planetário. Vejam mais detalhes sobre ele em http://www.sciencenter.org/.

A estação do Sol, eu à esquerda e a minha esposa. Pode-se ver um pouco ao fundo e à minha direita a estação de Mercúrio (novembro/1997).
A estação do Sol, eu à esquerda e a minha esposa. Pode-se ver um pouco ao fundo e à minha direita a estação de Mercúrio (novembro/1997).

 

As quatro estações: Mercúrio, Vênus, Terra e Marte, na praça central de Ithaca, NY (novembro/1997).
As quatro estações: Mercúrio, Vênus, Terra e Marte, na praça central de Ithaca, NY (novembro/1997).

 

Eu ao lado da estação da Terra (agosto/2015).
Eu ao lado da estação da Terra (agosto/2015).

 

Para mais informações sobre a vida e a obra de Carl Sagan, os interessados podem consultar o Portal Carl Sagan em http://www.carlsagan.com/.

Releiam também a coluna de 13 de setembro de 2019 intitulada Um passeio de galáxias, que descreve um outro passeio astronômico, fortemente inspirado no de Carl Sagan.

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Domingos Soares
FLORESTA COSMOS
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