ATRAVÉS DO UNIVERSO –O universo num vintém

domingosO GEDAI publica o sétimo texto da série  “ATRAVÉS DO UNIVERSO”, coluna mensal do prof. Domingos Soares (Departamento de Física/UFMG). Conheça mais sobre o autor em sua página eletrônica. Veja os textos anteriores da série clicando neste link.

O universo num vintém

Domingos Soares

14 de maio de 2018

O Modelo Padrão da Cosmologia (MPC, o modelo do Estrondão) é a hipótese de trabalho dominante na ciência moderna da cosmologia. Fred Hoyle (1915-2001) foi crítico rigoroso e, por vezes, ferino do MPC por considerá-lo uma bela peça de metafísica. Mas o MPC possui características que conquistam as mentes científicas e tentarei mostrar algumas delas. (Lembrando que a beleza do MPC é etérea, não se sustenta na realidade física, mas sim, como quer Hoyle, em suposições metafísicas.)

Vamos então a uma descrição simplificada do universo — “o universo num vintém”.

A minha fonte é a página eletrônica do LoCo (Low-frequency Cosmology Group da Universidade Estadual do Arizona, Estados Unidos). Aprenderemos um pouco sobre esta quimera científica pelas mãos do LoCo, através de um dos seus principais projetos, o EDGES, onde encontramos a bela imagem abaixo, que conta a história do universo segundo o MPC.

Hubble spectroscopically confirms remotest galaxy today

A história do universo desde o Estrondão até os dias atuais. O tempo é contado retroativamente em bilhão de anos no eixo horizontal inferior e em desvio para o vermelho (z → ∞ no Estrondão ≡ 13,8 Gano) no eixo horizontal superior. A existência da raça humana no dia presente está assinalada por um de seus mais ilustres representantes, o Telescópio Espacial Hubble.


Tradução dos termos que aparecem no desenho: Redshift (z) ≡ Desvio para o vermelho (z), Present day ≡ Dia presente, Billions of years ago ≡ Bilhões de anos atrás, Modern galaxies form ≡ Formam-se as galáxias modernas, Previous recordholder ≡ Recordista anterior, Reionisation era ≡ Era da reionização, Farthest galaxy Hubble has seen ≡ Galáxia mais distante vista pelo Hubble, Cosmic “Dark Ages” ≡ “Idade das Trevas” cósmica, First stars? ≡ Primeiras estrelas?, Big Bang ≡ Estrondão.


A radiação de objetos situados a distâncias cosmológicas é afetada pelo chamado desvio para o vermelho, o que significa que a radiação é observada com um comprimento de onda λ maior do que aquele com que foi emitida pela fonte distante λo. O desvio para o vermelho é geralmente representado pela letra z ≡ (λ − λo)/λo = Δλ/λo. Quando a fonte está localizada a uma determinada distância de nós, o desvio para o vermelho é diferente de zero e cresce com a distância, sendo igual a zero para a radiação emitida no presente instante cósmico, pois neste caso λ = λo. O primeiro astrônomo a sistematizar de forma coerente e consistente este efeito foi o estadunidense Edwin Hubble (1889-1953).

Com o auxílio de um modelo cosmológico teórico, pode-se calcular a distância de uma fonte e o instante cósmico em que a radiação foi emitida a partir de seu desvio para o vermelho z, o qual é uma grandeza observacional relativamente fácil de ser medida. O eixo temporal na figura foi calculado a partir de z usando o MPC. Quem quiser saber mais detalhes sobre o desvio para o vermelho é só ler este artigo.

Passarei agora à enumeração de alguns comentários sobre esta ilustração evolutiva do MPC. Uma descrição mais detalhada e bem compreensível de todos os aspectos apresentados na ilustração acima encontra-se também na página do EDGES.

1) A expansão do universo, que estava se desacelerando, torna-se acelerada no desvio para o vermelho z = 0,5. Notem que este valor de z é bem próximo do dia presente (z = 0). É por isto que se diz que a expansão passou de desacelerada para acelerada nos dias atuais. É bom se destacar também que as observações que levaram a esta conclusão foram feitas em objetos (supernovas do tipo Ia) existentes até o desvio para o vermelho um pouco maior do que 1, ou seja, são observações locais, do ponto de vista cósmico.

2) A banda marrom-amarelada logo após o Estrondão corresponde ao caldo cósmico de partículas elementares e radiação. No final da banda, na direção do presente, os primeiros núcleos atômicos leves já se formaram. Nesta banda a radiação estava presa aos íons e não se propagava livremente. Era como se um hipotético observador lá colocado estivesse no meio de uma bruma, de uma neblina muito densa. O fim da banda localiza-se em z = 1000 e a partir daí a Radiação de Fundo propaga-se livremente pelo cosmos. Esta é o chamado “desacoplamento” da matéria e da radiação e foi possível por causa da formação de átomos neutros. A radiação não era mais espalhada pelos íons, por estes não existirem em quantidade significativa. A temperatura caiu dos bilhões de graus iniciais para 3.000 graus e continuará caindo à medida que o universo se expande. Ela chegará, eventualmente, a 3 K (3 graus acima do zero absoluto) nos dias presentes.

3) A “Idade das Trevas” cósmica representa uma época em que ainda não haviam estrelas. Elas estavam por se formar através do colapso gravitacional das nuvens de átomos (H e He) neutros. Em alguma época desta era elas começam a aparecer.

4) As primeiras estrelas possuem massas enormes, centenas de massas solares, e emitem copiosa radiação ionizante, ultravioleta (UV) e raios X. Esta radiação faz com que o meio ambiente neutro passe a ser ionizado novamente. É a era da reionização. As galáxias mais primitivas são formadas. Algumas foram observadas pelo Telescópio Espacial Hubble.

5) As galáxias modernas, aquelas que fazem parte das modernas classificações morfológicas, formaram-se em z < 8.

Legal, não é? Pena que pode ser apenas uma fábula muito bonita, como mostro em Universo em expansão … ou não?

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Domingos Savio de Lima Soares
FLORESTA COSMOS
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